A dúvida que intitula este artigo é não só questão de dúvida para a sociedade em geral, mas inúmeros intelectuais que não conseguem simplesmente ver o sentido humano da palavra pessoa. Porém, algo diferencia-nos dos animais, que também são indivíduos, mas não são pessoas.
Quando falamos de indivíduo, estamos falando de um ser dividido de todos os outros seres e não divisível em outros seres. Não conseguimos portanto definir a sua espécie, aquela que é pensante (sapiens) e nem saber se esta espécie pode ser dividida numa pluralidade de indivíduos distintos sem perder sua natureza. Portanto, é muito restrito o conceito de indivíduo e, veremos ao final, que também não presume existir dignidade.
A humanidade e a individualidade existem, em cada pessoa, justamente porque não podemos dividir o homem em vários sem destruí-lo. Ademais, o conceito de individualidade não traz consigo aquilo que caracteriza de fato a pessoa e diferencia a sua forma humana em relação às demais, que é a sua alma, que é quem dá ser ao seu corpo.
Segundo Étienne Gilson, o princípio de individualização é a matéria, ela portanto é que causa a individualidade, ou seja, ele só é individual porque é uma substância concreta formada como um todo. É a substância dessa forma que faz com que o indivíduo subsista, e aqui retornamos a falar da alma, e para compreendermos a alma temos de elevar o conceito de individualidade ao de personalidade, porque a pessoa é muito mais que um indivíduo, ela é muito mais do que apenas uma pessoa individual, mas um todo inserido em outro todo.
Ela é um todo porque é presumida a sua dignidade como pessoa humana, diferentemente do seu individual. A sua forma individualista pode levar inclusive a interpretações materialistas da pessoa, pois se esta de fato é apenas uma em várias, desvalorizar-se-á sua dignidade e poder-se-á utiliza-la como instrumento de um meio para um fim mau, como ocorre na relação de Jogos, evidenciada por John Finnis (ler o artigo "O problema do reconhecimento humano na Teoria dos Jogos"). E aqui, já presumimos ser um fim mau pois atentar à dignidade da pessoa humana já é um mal que contamina o fim bom, como vimos no artigo passado.
Quanto à dignidade da pessoa humana, ela não é individual, ela é fruto da participação social e do encontro do meu "eu" no próximo, em prol do bem coletivo e próprio. Foi assim que o homem se civilizou, construiu nações e progrediu no planeta. Segundo João Paulo II, sendo individual e não-participativa, a pessoa está renunciando à sua própria dignidade, pois não há dignidade sem busca, não há evolução humana sem sujeitos e não há bem comum sem reconhecimento deste como seu bem próprio.
Já Gilson acredita que a dignidade está embuída à pessoa apenas pela sua racionalidade natural, pois ele define a pessoa humana como "a substância individual de um ser racional". Esta razão a torna dotada de capacidades que outros seres - que também são indivíduos -não possuem, como a possibilidade de escolha ou de apreender uma multiplicidade de objetos diferentes. Para ele, "a racionalidade é o princípio mesmo da liberdade da pessoa humana", o que eu pessoalmente discordo, pois a racionalidade é incidental à pessoa humana, já a sua liberdade, quando dependerem as circunstâncias, terá de ser buscada pelo seu auto-reconhecimento em relação à sua dignidade, onde vai ser, sim, escolha dela (pessoa) participar ativamente do desenvolvimento do seu bem em comum às outras pessoas, ou ser utilitário, renunciada aqui a sua dignidade.
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