quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Reforma política: chegou a hora?

Tem tomado grande espaço nos noticiários os inúmeros casos de corrupção envolvendo pessoas do partido do atual governo e de seus aliados. Ministérios afundados em corrupção, licitações feitas às escuras, ministros e governantes tomando as dores dos acusados de desvios, enfim, o caos em meio à sociedade política, na qual a totalidade da população brasileira depende direta ou indiretamente.
Em meio a tal situação, a CNBB, na pessoa de seu presidente Dom Raymundo Damasceno, iniciou uma nova campanha para discutir a reforma política e uma melhor alternativa institucional para o Brasil. Mais do que apenas um discurso qualquer pugnando pela ética, foi um verdadeiro apelo pela mudança das estruturas falhas do Estado, no sentido de que se estamos hoje contando com pessoas com fins corporativos ou individuais em meio à sociedade política é porque de alguma maneira a forma institucional permite que essas pessoas cheguem até lá e possam se manter. Mais do que uma mera modificação na lei eleitoral, foi demonstrada a necessidade de uma mudança profunda, de forma com que este problema institucional seja completamente eliminado e não necessite de novas mudanças num futuro tão próximo.
Ocorre que a forma de Estado brasileira tem desrespeitado no decorrer dos tempos o chamado princípio de subsidiariedade, que ensina que se um ente é incapaz de fazer uma determinada função básica à sua existência, deve se dirigir ao ente superior a ele, que deve negar essa subsídio quando se mostrar possível a execução dessa função pelo ente inferior. Assim, desde a formação política da Velha República, o Brasil tem invertido esses papéis em relação ao princípio de subsidiariedade, ora delegando uma autonomia muito precoce aos Estados recém federados e ignorando os municípios - como ocorreu em 1889 -, ora eliminando totalmente essa autonomia com a constituição do Estado Novo de Getúlio Vargas, que centralizou o poder e impediu a auto-aplicação do princípio. As cicatrizes desses erros institucionais permanecem até hoje e são percebidas desde a centralização do sistema tributário - onde 80% dos tributos ficam nas mãos da União, bem longe dos municípios e das pessoas - até a concentração exacerbada do poder político na pessoa do Presidente da República, que sozinho detém a chefia do Estado, do governo e da administração, o que poderíamos classificar como um verdadeiro absolutismo moderno, com roupas de democracia e legitimado pelo sufrágio universal.
Agora que os problemas do Brasil estão longe de ser os econômicos, devemos refletir sobre o sistema presidencialista e como ele tem se tornado insustentável para a sociedade organizada na forma federativa. Neste sentido, até mesmo a superpotência americana tem demonstrado a fragilidade e a falta de eficácia deste sistema, uma vez demonstradas as dificuldades do democrata Barack Obama em aprovar o novo teto da dívida americana em uma câmara com maioria parlamentar republicana. No Brasil, nessas situações, o presidente "compraria" a oposição com a moeda da administração pública, mas em países parlamentaristas o chefe de governo elegantemente renunciaria e seriam convocadas novas eleições, que seriam vencidas pela maioria eleita pelo povo.
E então vos pergunto: há sentido em haver uma votação direta para Presidente da República? Respondo: sim, desde que este presidente seja um mero chefe de Estado, guardião da soberania nacional, e não detenha funções de governo e nem de administração. 
A verdade é que existe um caminho muito difícil de ser percorrido sem a imposição popular, pois este atentado partidário à administração pública pode jamais cessar, visto que rende muito dinheiro a todos os partidos políticos e a alguns candidatos eleitos, dependentes do atual sistema eleitoral. Mas como nos ensina o Catecismo: o bem comum, que se origina do Estado, além de ser nosso e de todos, é a razão de ser da autoridade política (a. 1910). Havendo outra razão de ser, é uma deturpação de seu papel, um desvio moral que tira a razão da existência do ente político maior. Sendo assim, é nosso dever nos preocuparmos com este bem comum através da política, formando uma nação verdadeira que seja dependente de seu povo, e nunca o contrário, como atualmente ocorre.

Publicado na Revista In Guardia nº 2/2011

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