Neste mês comemoramos algo que não ocorria há mais de 30 anos nos morros do Rio de Janeiro: a ocupação de dois grandes complexos de favelas que eram consideradas, mais do que meros pontos de boca de fumo, um estabelecimento matriz do mal que é o tráfico de drogas carioca. Os números das apreensões são impressionantes: mais de 40 toneladas de maconha, mais de 130kg de cocaína, 50 fuzis, e por aí vai. Isso sem falar no luxo oculto dos chefões do tráfico, em apartamentos melhores, mais bem mobiliados e mais bem decorados que muita habitação do Leblon. Ou seja, o Complexo do Alemão e a Vila Cruzeiro eram um mundo a parte, e o Estado não fazia parte deste mundo.
Há 30 anos, os favelados sofrem com a escassez da educação e com a falta de oportunidade, pois não houve, nestes anos, qualquer interesse nas suas qualificações e iniciações profissionais, tendo eles de depender apenas dos seus próprios instintos e dos seus escassos conhecimentos para sobreviver. E nós sabemos: na selva, vale tudo. E assim aconteceu. Muitos começaram no crime, evoluíram para traficantes de drogas, e criaram corporações do mal - verdadeiros conglomerados do crime organizado, a serviço dos próprios criminosos e de suas comunidades, ocupando o espaço que o Estado não ocupava.
Agora, uma reflexão é necessária. Chegamos ao ponto de fazer guerra contra a própria pessoa humana, quando o Estado, que deveria servir a esta pessoa humana na luz dos princípios mais básicos (subsidiariedade, solidariedade e dignidade da pessoa humana), não o fez, e criou seres tão selvagens e frios quanto animais.
Os moradores das comunidades, em momentos de grande lucidez, concederam ao BOPE - divisão especial estratégica da polícia militar carioca - todo o tipo de suprimento - água, café e comida - demonstrando que não é o bem próprio, através das corporações do tráfico, que as pessoas dali desejam, mas sim o bem comum através do Estado que, embora completamente ausente nestes anos todos, é o que ainda estas pessoas acreditam. Pois só resta a elas acreditarem nisto.
Se houver agora uma maior integração do Estado com estes morros, que estão acessíveis e ocupados. Se parte da população carioca colaborar não comprando as drogas que estes traficantes vendem, seremos capazes de começar a falar em dignidade da pessoa humana e de cultivar o que é mais valioso que qualquer coisa dentro daqueles morros: as vidas que lá vivem.
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