Há quem diga que o golpe ocorrido, no dia 15 de novembro de 1889, foi um passo à frente para o Brasil, que iria se tornar uma federação, igualzinha aos Estados Unidos da América, uma nação, até então, em ascensão. Copiar um modelo de forma arbitrária era algo altamente necessário a um Estado em formação como o Brasil, que alguns bem letrados consideravam chamar de monarquia federativa - após ter-se promulgado o Ato Institucional de 1834, que criou as províncias e as deu autonomias - o que os seguidores da ideologia de Montesquieu no Brasil contestaram energicamente, uma vez que, para eles, a monarquia era totalmente incompatível ao sistema federal, cometendo-se ali uma verdadeira confusão entre o que é uma instituição política do Estado e o que é uma instituição de Governo. Mas isto não importava. O que importava era fazer a elite brasileira delirar cada vez mais com a idéia de fazer do Brasil um sucesso econômico, tal como estava se tornando os Estados Unidos.
As ideologias dogmáticas, aquelas que não permitem à pessoa humana que ela seja exercício pleno de sua pluralidade em face da sociedade política, tendem por esquecer o que é o bem de todos, que se confunde também com o seu próprio bem. No momento em que em uma relação de paixões e inveja, que, embora pareçam, estão longe de serem virtudes como a prudência e a docilidade, atropelam a "phylia" e são movidas apenas pelos seus interesses de auto-determinar o que devemos ser e agir, estamos, então, beirando o utilitarismo, onde não há espaço para que a pessoa exerça sua dignidade como sujeito da construção do Estado, mas que seja um mero meio deste chegar a um objetivo. Começam-se então com pequenas idéias, pequenos sentimentos, até que, com ânimos em comum, se tornam um problema para a devida finalização do bem comum. E quem paga a conta deste descaso é a sociedade não-política, que por não ter sido sujeito da construção de seu bem comum, foi minimizada a um utilitário, uma célula no grande organismo que é movido pelo Estado.
O que aconteceu no Brasil, naquela manhã de 15 de novembro de 1889, foi a maior violação institucional política de sua história. E para quem pensa que os Estados, aqueles que iriam conservar suas autonomias estavam a festejar naquela manhã, se engana. João Camilo de Oliveira Torres descreve que as províncias foram informadas de que passavam a se tornar Estados-membros através de um telegrama. Nada mais indiferente para um discurso federalista que, na verdade, era da boca para fora. E o princípio de subsidiariedade, aquele que regulava e preservava as autonomias das províncias, este foi jogado no lixo por esta ideologia republicana. Fomos vítimas de um liberalismo exacerbado, de uma "febre" do momento, mas ainda não fomos institucionalmente maduros para superá-lo.
O princípio de subsidiariedade, ao contrário do federalismo republicano solidificado intelectualmente por Montesquieu, não é ideológico, e não é sequer exclusivo das federações, mas da vida humana em geral, seja das relações entre pessoas, seja da atuação das instituições presentes na sociedade. Ele finaliza a justiça nestas relações, medidas pela prudência, para que se procure o bem do próximo no bem comum. Acaba, portanto, por ser um método para uso circunstancial das virtudes que o compõem, que combinadas com a razão prática, potenciam-no para o campo da realidade.
Há uma coisa que é essencial para se conceituar um sistema federal, e é a sua autonomia em relação aos entes federados. Sem subsidiariedade para que se coloquem limites, de forma com que a União não "engula" os outros entes e não invada suas competências e suas capacidades, não há federalismo. E sem consciência pessoal de que a auto-participação é, não uma mera faculdade, mas um dever que a pessoa tem em pról do seu bem próprio e dos outros, no sentido de buscar soluções para que assim não seja vítima da renúncia de sua própria dignidade, não haverá mudança.
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